top of page

Sala de Fotografia analisa: FestFoto POA 2017


Há que se ter persistência. Essa é uma das lições que aprendemos no último dia da programação do festival de fotografia de Porto Alegre, o FestFoto, neste ano de 2017. Desde a editora que publica material sobre fotógrafos online, passando pelo Museu que demonstrou que pode aceitar muitos trabalhos em fotografia, até o fotógrafo americano Fred Baldwin que contou a sua trajetória, ficou claro isso: com persistência, é possível colocar bons trabalhos em fotografia à mostra. A Sala de Fotografia esteve por lá no sábado, dia do encerramento das atividades, que fechou o dia com um concerto da OSPA – Orquestra Sinfônica de Porto Alegre.

Neste ano, o FestFoto ocorreu de 9 a 13 de maio, no Centro Cultural CEE Erico Verissimo, no centro da capital gaúcha. O tema, para comemorar os dez anos de realização do festival foi “Celebrando Amigos”. Assim, dentro dessa proposta, a direção pediu aos seus parceiros de longa data que apresentassem a sua carreira na fotografia, mais do que apenas falar de suas produções culturais.

Desta forma, Wendy Watriss e Frederick Baldwin, os responsáveis pelo Foto Fest – festival de fotografia de Houston, nos Estados Unidos, contaram suas trajetórias. Nós já tínhamos assistido a eles no ano passado, tanto no Fest Foto quanto no Fórum Latino Americano de Fotografia em São Paulo. Nessas ocasiões anteriores, ouvimos Wendy falar sobre Houston em Porto Alegre, e sobre a sua trajetória em São Paulo. A fotógrafa desenvolveu um importante trabalho com reportagens e fotos sobre os efeitos tóxicos do Agente Laranja – um defensivo agrícola utilizado na guerra do Vietã e que acabou tendo efeitos devastadores na vida dos soldados americanos. (confira o que contamos sobre o seu relato em SP neste link, e sobre POA neste link). Ela mostrou na apresentação desta vez fotos suas na África e na Nicarágua. As imagens dos veteranos de guerra eram realmente impactantes.

“Se você se importa com quem você está fotografando, e não só explorando as pessoas para promover a sua carreira, tem que continuar trabalhando para além da imagem.”

Wendy Watriss

A novidade para nós, então, foi ouvir Fred Baldwin, seu marido e parceiro no festival de Houston, contar sua trajetória na fotografia. O casal tem muita história pra contar. E mantiveram a plateia grudada em suas palavras. Fred publicou suas fotos nas revistas mais importantes do mundo, como a National Geographic, a Geo e a New York Magazine.

Fred então iniciou a sua fala após Wendy. Explicou que não era nem de longe tão inteligente como ela, e nem ela tinha feito as trapalhadas que ele fez. Fazendo piada de si mesmo o tempo todo, o fotógrafo começou a narrar como entrou na fotografia por acaso, pois não sabia exercer nenhuma profissão, já que demorou para iniciar sua vida acadêmica. Mas a sua fala foi inspiradora por mostrar a sua persistência. Quando quis conhecer o artista Pablo Picasso, ficou em frente a sua casa por dias, e escreveu uma carta muito engraçada, cheia de desenhos. E assim conheceu seu ídolo e passou um dia todo com ele, fotografando.

“Percebi então que não importava se eu não sabia fazer nada. Mas eu tive criatividade, e passei por cima do grande medo. E então notei que eu precisava pegar qualquer chance e agir.” Fred Baldwin

Mais tarde, acabou em uma maratona, se fazendo passar por um repórter de revista. Quando suas fotos não ficaram boas, por falta de conhecimento técnico, convenceu a organização do evento a lhe dar um novo ingresso para ele tentar de novo. Ainda, conseguiu entrar na cerimônia de premiação do Prêmio Nobel com as histórias que contava para convencer a todos, fazendo assim importantes amizades que lhe foram úteis quando quis fotografar o Ártico.

Fred também mostrou um amplo ensaio que fez em uma comunidade nos Estados Unidos ao longo de dez anos. E ainda relatou o seu encontro com simpatizantes da Klu Klux Klan, um movimento racista e violenta dos Estados Unidos. Ele jamais mostrou essas fotos para alguém à época. Só depois ele percebeu que se o tivesse feito, mostrado, por exemplo, a importante agência Magnum, isso teria mudado a sua vida, pois ele conseguiu imagens de dentro de um movimento muito fechado. Esta foi uma lição que lhe incentivou a promover o festival de fotografia em Houston: queria dar a chance a outros fotógrafos de mostrarem o seu trabalho e mudar as suas vidas.

Mas antes das apresentações de Fred e Wendy, que encerraram o festival de Porto Alegre, a tarde de sábado trouxe mais. Fabián Gonçalves Borrega falou sobre o Museu de Arte das Américas, localizado em Washington, nos Estados Unidos. Em sua fala, ele explicou e mostrou a fotografia que ganha espaço no museu, por meio de exposições que depois compõem o acervo. Há brasileiros nessa coleção, como Miguel Chikaoka e o gaúcho Leopoldo Plentz. A escolha das exposições se dão por temas pré-definidos pelo museu: a atual é sobre paisagens. O interessante da fala de Fabián foi mostrar a plateia que é possível sim ter obras de fotografia contemporânea expostas em um museu internacional, basta ter um projeto consistente e se inscrever para participar.

“A escolha dos fotógrafos para exposições no Museu de Arte das Américas se dá devido a um trabalho consistente no tema, não que o participante seja necessariamente com uma carreira consolidada na fotografia.” Fabián Gonçalves Borrega

Ainda no sábado houve espaço para Michael Itkoff, da Daylight Editora, falar sobre “livros de fotografia no território digital”. Michael, que também veio dos Estados Unidos, contou como a editora começou os seus trabalhos ainda em 2003, quando lançou uma revista de fotografia. Já no segundo número dela, tiveram uma boa ideia: deram câmeras ao povo do Iraque para que eles pudessem registrar a sua própria realidade em meio a guerra. Assim, conseguiram fotos mais humanas e mais cotidianas do que se tivessem enviado um fotógrafo estrangeiro cobrir o conflito.

Depois, para promover a revista, a editora passou a lançar pequenos teasers no site, com vídeos onde narração dos fotógrafos que estavam na revista se mesclavam às suas fotos. Assim se iniciou a tradição digital de seus trabalhos. Hoje, a editora publica livros, e mantém em seu site um amplo catálogo de portfólios de fotógrafos, dando a chance, assim, de eles exibirem o seu trabalho para o mundo todo por meio da internet. Nesses portfólios, se unem fotos grandes, com vídeos e citações, mesclando o conteúdo de diversas formas. Acesse para conhecer.

Além disso, a editora está com inscrições abertas a um prêmio, o Photoawards. Michael explicou que tipo de trabalho estão interessados na editora.

“Nos interessamos por trabalhos que apresentem uma digestão fácil de assuntos difíceis. Trabalhos que informem ao público e que mudem as suas atitudes, mesmo quando este nem percebe que isto está acontecendo. Queremos trabalhos que usem fotografias para mostrar o mundo e informem as pessoas sobre o mundo”. Michael Itkoff

O conteúdo de Daylight está em inglês, mas mesmo para quem não compreende o idioma, há muito para ser visto no site.

Exposições

Outra importante contribuição do FestFoto POA – para além das importantes palestras apresentadas nessa década de festival, bem como as leituras de portfólio, que já oportunizaram a muitos fotógrafos demonstrarem o seu trabalho no exterior - o festival também apresenta muitas exposições de trabalhos por meio de suas convocatórias.

Em uma sala com diversos televisores, são exibidas séries de fotógrafos do mundo todo, onde os participantes do festival podem se aproximar do melhor da fotografia contemporânea. As TV`s podem não ter o glamour nem as sensações proporcionadas por uma exposição impressa no papel. Mas elas se constituem em uma boa alternativa de economia financeira, ao mesmo tempo que oportunizam esse contato com obras inspiradoras.

O Fest Foto também trouxe excelentes exposições impressas no primeiro andar do Centro Cultural. Como a Marrocos, do Coletivo Gringo (formado por Gui Christ e Gabi Di Bella), na qual os fotógrafos acompanharam a ocupação ilegal de um prédio em São Paulo, registrando seus moradores, que chegaram a quase 3 mil, e seu cotidiano. Ou ainda a exposição “Você mereceu” de Marília Oliveira, com fotos em formato pequeno de 10x15cm. O próprio tamanho celebra a intimidade daquelas fotos, na qual a artista revela um amor que se foi e não faz mais sentido em fotos íntimas, mas borradas, tremidas, como se fossem a materialização de lembranças pouco nítidas visualmente, mas fortes emocionalmente. Em uma segunda parte, Marília expõe fotos na qual o casal está raspado da paisagem, junto a pequenos bilhetes que eternizavam um amor para todo o sempre por meio de palavras apaixonadas. O FestFoto ainda contou com a exposição Rastros D`Eus, de Fernanda Chemale, com diversos autorretratos da artista.

Junto a estas exposições, TV`s exibiam fotos de fotógrafos que foram homenageados ao longo desta década de Fest Foto. Eles foram convidados a selecionar 10 fotos suas que conversassem com o tema “Celebrando amigos”.

Imagens da exposição "Marrocos", de Coletivo Gringo

Imagens da exposição "Você Mereceu", de Marília Oliveira

Online

Uma importante atitude de difusão do conhecimento por parte do festival foi a transmissão ao vivo das mesas no Facebook do seu coordenador, Carlos Carvalho. Desta forma, quem não pode ir até o evento, conseguiu acompanhar o seu conteúdo de qualquer lugar.

Conclusões

Neste último dia de programação do Fest Foto, houve uma constância: todos os palestrantes falavam um idioma estrangeiro, vindo de outros países para cá nos passarem os seus conhecimentos. Assim também se denota a importância e a internacionalização do Festival de Fotografia de Porto Alegre. O conteúdo das palestras, sempre gratuitas, traz conhecimentos muito ricos a quem participa, abrindo a cabeça para novos conteúdos, novas formas de pensar e fazer fotografia, ampliando ainda os horizontes de como se inserir no mercado fotográfico internacional.

Que venham mais muitas décadas de festival de fotografia em Porto Alegre. A sua importância faz valer cada segundo na vida dos fotógrafos.

Texto: Sabrina Didoné (jornalista - 0018277/RS) e Liliane Giordano (mestre em Educação: arte, linguagem e tecnologia)

Fotos: Liliane Giordano

bottom of page