top of page

Por uma luz Paulo Freiriana: artigo de Carlos Carvalho na Revista Sala de Fotografia

📒A edição nº 6 da Revista Sala de Fotografia inaugurou uma nova seção. São vozes diferentes na publicação online e gratuita, por meio de artigos que convidados escrevem. Para iniciar, tivemos a presença do fotógrafo Carlos Carvalho, diretor do FestFotoPoA - um dos mais importantes festivais de fotografia do país. Obrigada, Carlos, ficamos honradas com sua presença na Revista! Confira na íntegra seu texto, ou acesse a revista neste link.


Por uma luz Paulo Freiriana


"Os manuais clássicos de fotografia e de equipamentos fotográficos traçam roteiros, coordenadas e um agrupamento de números que em última análise traçam um roteiro já pré-definido no aparato fotográfico para que se obtenha “uma fotografia dita correta”. As novas tecnologias transformaram esses roteiros em um algoritmo para que não se perceba inclusive que esse roteiro “existe” e muitos possam fazer uma “fotografia correta”. Do ponto de vista da democratização da alegria, aquela que todos nós sentimos quando fazemos uma fotografia, agora com o celular, trata-se do roteiro lógico da indústria e do aparato. Fotógrafos que inscreveram seus nomes na história acrescentaram a esses roteiros suas marcas pessoais, traçando rotas diferentes, alongando ou encurtando caminhos, mas sempre recusando o caminho determinado a priori, seja no campo do documento (fotojornalismo, documental e todas variações de genética vernacular), seja no experimento que permitiu o ingresso da fotografia no território da arte e um protagonismo na arte contemporânea.

Seja qual for o sintoma – e aqui vou tratar como sintoma o impulso vital a intenção do fotografo – arte ou documento ou documento/arte ou arte/documento, a experiência fotográfica sempre foi o vetor que desqualificou o peso e a força da palavra correta no território da fotografia. É uma vocação nata da fotografia não ser correta, nem em princípios técnicos nem do ponto de vista expressivo. Não existe um correção técnica básica a não ser subordinada ao sintoma, ao impulso do fotógrafo e neste caso para que o impulso fique bem “resolvido” enquanto imagem. No entanto o impulso permanece já enquanto imagem, a cada confronto com o olhar do expectador, do “outro”. É uma flecha em busca de alvos ambulantes e a gênese aqui não é a flecha mas o caminho como impulso fotográfico vital que ela vai percorrer.

Toda essa reflexão busca na verdade tentar trazer para o caminho dessa flecha, o elemento básico e primordial da fotografia que é a luz e para a experiência fotográfica a possibilidade de tornar-se um dos alvos desse caminho impulso.

Trazendo o discurso para a prática e tentando dividir a experiência pessoal de um projeto de fotografia documental - que chamo de fotografia de informação - me dei conta que a busca primária da informação enfraquece a própria ao não perceber outras luzes. Em outras palavras, a luz como uma forma de informação e potência expressiva se oferece a quem saiba percebê-la, enxergá-la. E esse perceber exige uma consciência da interação necessária com o objeto fotografado, uma atitude em busca de uma luz que revele a experiência, uma luz Paulo Freiriana.

O dilema do fotógrafo entre a solidão da criação e o confronto com o olhar do outro é da natureza intrínseca do ser humano e não há escolhas. No entanto a experiência da percepção dos caminhos da luz talvez seja uma das mais deliciosas descobertas depois do fogo, da roda ou do....celular. Esse momento da quase imagem, desse Big-Bang fotográfico que é a angústia que nos alimenta desde as experiências pictóricas de Cézanne, não se dissipa enquanto angústia mas se realiza enquanto luz percebida, enquanto informação, ou melhor enquanto consciência. E é claro, pode-se ou não estar à altura dessa consciência.

É uma busca. A busca por uma luz Paulo Freiriana." - por Carlos Carvalho


📸 FOTO de Carlos Carvalho: Futebol no assentamento Cidade dos Meninos e Minas/MG - 1988


Comments


bottom of page